sábado, 16 de fevereiro de 2008

Melhores empresas para trabalhar desconhecem funcionários homossexuais

Por William magalhães e Roberto Cushman 15/2/2008 - 20:28
Revista A Capa
http://www.acapa.com.br/

Anualmente, a consultoria Great Place to Work Institute divulga um relatório com as 100 Melhores Empresas Para Trabalhar, publicado pela revista Época. Nele, empresas buscam a excelência de qualidade em seu ambiente de trabalho seja através de benefícios – que vão do básico plano de saúde a massagens terapêuticas -, ou políticas voltadas ao bem estar dos funcionários.

Baseado na lista, escolhemos as primeiras 25 do ranking para alvo dessa reportagem. A intenção era descobrir como as empresas têm abordado a questão da diversidade sexual e se estendiam os benefícios disponibilizados a funcionários héteros aos homossexuais, como, por exemplo, a inclusão de parceiro de mesmo sexo em plano de saúde.

Apenas 14 organizações responderam ao nosso questionário. As 11 empresas restantes (Caterpillar, Pormade, Laboratório Sabin, Coats – Extremoz e Borborema, Rimo, Duke-Energy, Sabre Travel Network, Todeschini, Gazin, Plascar e São Bernardo Saúde) não responderam nem a nossa primeira tentativa de contato.

Entre as empresas que nos responderam, duas, a Accor e a BV Financeira, alegaram não conseguir porta vozes para falar sobre o assunto. Vale ressaltar, que as empresas foram procuradas três semanas antes do fechamento da edição. As outras doze empataram: em seis há benefícios estendidos aos casais homoafetivos, nas outras não.

A eleição
Para participar da pesquisa, a empresa deve obedecer alguns critérios do instituto como ter mais de 100 colaboradores, por exemplo. Outra medida a ser seguida é não influenciar ou intimidar os funcionários na hora da votação. Isso porque o resultado final é feito a partir de dois questionários: a) a empresa diz quais são suas políticas e benefícios oferecidos; b) o funcionário faz uma avaliação de como ele percebe isto.

No questionário respondido pelos colaboradores há uma questão abordando especificamente a discriminação por conta da orientação sexual. Os funcionários classificam numa escala de 1 a 5, de acordo com seu nível de satisfação, a afirmativa: “Me sinto bem tratado independente da minha opção (orientação) sexual”.

De acordo com Michelle Matos, coordenadora do projeto da pesquisa do GPWI, “94% das pessoas dizem não se sentirem discriminadas no ambiente de trabalho. Esse índice se repete na avaliação da América Latina do instituto e na lista setorial das 50 melhores empresas da área de TI/Telecom. Entre as 25 melhores o índice sobe para 96%”. O índice de imparcialidade nessa resposta segundo Michelle é de 75% nos mais de 30 países onde a pesquisa é realizada. Esses dados podem indicar no mínimo duas coisas. Ou não há preconceito no ambientes de trabalho, ou a imensa maioria que responde o questionário é hétero e não sente na pele a discriminação.

Em suma, quem escolhe sua empresa como a melhor para trabalhar são os próprios funcionários, já que a avaliação dos colaboradores tem peso de 75% na avaliação final do instituto.

A turma do não
Em comum, as respostas das empresas da turma do não, composta por aquelas que afirmaram não possuir políticas ou benefícios para homossexuais, diziam apoiar a diversidade e frisavam não haver discriminação de qualquer espécie no ambiente de trabalho. “A Microsoft incentiva a diversidade em seu ambiente de trabalho e não discrimina ou privilegia seus funcionários por conta da sua orientação sexual, racial ou religiosa”, afirmou, por e-mail, Elisa Furusho diretora de Recursos Humanos da Microsoft, empresa do não.

O Magazine Luiza, oitavo na classificação da revista Época, afirmou não ter possibilidade de atender a pauta. O motivo? A porta-voz da empresa esclarece: "Infelizmente, não teremos como participar da matéria porque não temos porta-voz para falar sobre o assunto".

Outra resposta nebulosa veio da Promon, do ramo de engenharia. Além de não responder objetivamente as perguntas, a companhia afirmou: “como a Promon é uma empresa em que cerca de 90% de seus funcionários são profissionais altamente qualificados, com pós-graduação etc... Não há discriminação a homossexuais. Isso é encarado de forma normal e, por esse motivo, não há nenhum programa especial para isso”.

Multinacionais, como Fedex e Coca-Cola Brasil, respectivamente 6º e 24º lugar no ranking, afirmam seguir política mundial que favorece e valoriza a diversidade. Porém, os planos de saúde oferecidos não permitem a inclusão de parceiros de mesmo sexo, pelo menos no Brasil. Segundo a Fedex, “atualmente o plano de saúde disponível para funcionários só permite a inclusão de cônjuges reconhecidos pela lei (marido ou esposa) e filhos”. Por outro lado, a Coca-Cola, aproximadamente 400 colaboradores, afirma nunca ter sido procurada por um funcionário solicitando o benefício. “Ainda não recebemos nenhum pedido específico neste sentido”.

Caso semelhante é o da Intelig Telecom. Pertencente a turma do sim, adota o Bradesco Saúde que permite a inclusão de parceiro do mesmo sexo. No entanto, nenhum funcionário, de um total de 600, solicitou a adesão. A empresa afirma que “existe um projeto em estudo sobre a conscientização da diversidade, sem data para sem implementado, que aborda, dentre outros pontos, a questão da homossexualidade na vida corporativa”.

A turma do sim
Leandro Mangili, responsável pela Gestão de Pessoas na Zanzini Móveis, diz que o plano de saúde disponível para os funcionários permite a inclusão de homossexuais com união estável homologada. A Zanzini conta com 250 pessoas trabalhando, sendo duas delas homossexuais assumidos que trabalham na produção, “aliás são excelentes colaboradores”, diz.

A Unimed de Vales do Taquari e Rio Pardo, no Rio Grande Sul, é mais uma da lista em que funcionários homossexuais podem incluir parceiros no plano. Mas, de acordo com Patrícia Casagrande, responsável pelo RH, “não há homossexuais na empresa”. Vale lembrar, os planos de saúde comercializados pela Unimed permitem a inclusão de casais gays.

O Laboratório Apsen também declara não haver nenhum tipo de preconceito no recrutamento e seleção dos colaboradores. O atual plano de saúde permite inclusão de casais gays, mas novamente não há funcionários assumidos. Como proteção, Floriano Serra, Diretor de RH e Qualidade de Vida, diz que a constituição interna proíbe explicitamente qualquer tipo de preconceito ou discriminação.

A Serasa, terceira colocada no ranking, afirmou por meio de sua assessoria “não haver problemas” na inclusão de parceiro de mesmo sexo em plano de saúde. Mas o RH afirmou que dados sobre funcionários que (e se) aderiram ao benefício são sigilosos.

A primeira colocada no ranking, Chemtech, do ramo da tecnologia da informação, destacou que normas de condutas internas inibem o preconceito e a discriminação dentro da companhia. "Todo funcionário, ao entrar para a Chemtech, assina um código de conduta, que fica permanentemente disponível em nossa intranet e no site da empresa". Diz um item: "Nenhum colaborador pode atuar de maneira discriminatória, especialmente quanto à raça, religião, idade, sexo, orientação sexual...". A companhia, em 18 anos, nunca teve um caso de homossexual assumido e acredita que “quando houver, o funcionário será ouvido para expor suas necessidades e criar uma política específica junto com a empresa. Estamos prontos para quando isso acontecer. Mesmo com o tema ainda em discussão no governo e com divergências doutrinárias, acreditamos que esse processo seja aceito e conduzido com tranqüilidade”.

Os exemplos
Lendo a reportagem até aqui você deve ter estranhado a falta de uma empresa “do não”. A companhia em questão é a Kaizen e realmente eles não têm políticas para funcionários homossexuais, nem há gays assumidos na empresa. Mas, o que deixa o posicionamento da corporação anos luz a frente do seleto grupo “do não” foi a resposta de Daniel Dystyler, diretor de gestão de talentos da empresa.

De acordo com Daniel, “as perguntas geraram uma série de questionamentos internos muito positivos e providenciais. Estamos, neste momento, criando um grupo de trabalho para discutir os assuntos e definir como atuar”. O diretor ressalta, ainda, não ser a primeira vez que perguntas de terceiros influenciaram na cultura da empresa. “Foi o caso de políticas específicas para as mulheres. Motivados por perguntas como as suas, criamos um grupo de trabalho para estudar o assunto e diversas ações nasceram dessa iniciativa. Agora vamos fazer o mesmo em relação às nossas políticas para homossexuais”.

Hour concour, o Banco Real não estava na lista das 25, mas encontra-se na lista das 100. Merece ser incluído nesta matéria porque serve de exemplo em se tratando de políticas pró-gays efetivas. O banco holandês possui uma política Global de Diversidade e Inclusão, onde a diversidade sexual também tem seu espaço. Segundo Pedro Prochno, relações com imprensa, “existe um Grupo GLS formado por funcionários homossexuais assumidos e simpatizantes. Criado em 2006, ele intensificou as ações internas e externas desenvolvidas para o público: benefícios, eventos como a Feira Pride & Attitude e a Parada do Orgulho GLBT, e até um produto do banco - crédito imobiliário, que aceita composição de renda familiar proveniente de união homoafetiva”.

Os funcionários e seus companheiros são elegíveis a todos os benefícios, como Assistência Médica, Odontológica, Previdência Privada, Ajuda Social Extraordinária (para compra de medicamentos ou tratamentos não cobertos pelo convênio), Seguro de Vida e PAPE (Programa de Apoio Pessoal Especializado). As políticas de inclusão são divulgadas nos veículos de comunicação interna.
O Banco disponibiliza ainda um canal de diálogo do funcionário com a organização que esclarece dilemas e dúvidas de conduta e acolhe denúncias referentes à discriminação e quaisquer condutas consideradas suspeitas, criminosas ou antiéticas.

De longe, um exemplo a ser seguido.

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